quinta-feira, 26 de novembro de 2009

Fortaleza em meio à selva

(Memórias)

Subir no muro do parquinho em busca de araçás. No fim da rua, em um condomínio fechado. Casinhas brancas de dois andares: a nossa era a primeira à esquerda de quem entrava. Encontrar um passarinho morto sob a escadaria. Não achar nenhuma graça em aulas de judô – aos dezessete, voltei àquela casa que era o meu jardim da infância e me pareceu que haviam reduzido muito o espaço. Ganhar uma bicicleta no palito do sorvete. Um fim de tarde, atravessando o viaduto ao lado da rodoviária, ouvir de meu pai uma história qualquer sobre um acidente de carro. Luzes de freio. Luzes. Por que eu me lembro dessas luzes com tamanha nitidez?

Meu pai dava plantões no Hospital Psiquiátrico. Eu não tinha mais que cinco anos: penumbra da memória, noites de poeira nos cenários só meus da capital paranaense. Um quarto pequeno, lâmpadas não muito fortes. Eu fui com ele, talvez mais de uma vez, passar a noite naquela casa de pessoas doentes – não loucos, eu não sabia ainda o que era isso; e meu pai era muito generoso por cuidar tão bem daquelas gentes. E ainda assim encontrar um tempo para estar comigo naquele quarto, jogando futebol de botão, assistindo a um Globo Repórter sobre os meios de sobreviver na selva. Um prato de lesmas, é tudo de que me lembro naquele programa. Por ser inédito, e não desagradável: um mundo novo, apenas, de uma estranheza colorida e fascinante.

Mas acho que dormi bem antes do final da reportagem.

3 comentários:

Vizionario disse...

Legal. Regaste e composição.

Ivy Farias disse...

Que me desculpe a verdade, mas ganhar bicicleta no palito de sorvete parece sonho infantil...

Daniel Braga Lee disse...

Bah, Araçá! he he he

Nem lembrava que isso existia! xD