quinta-feira, 7 de abril de 2011

mapatemporario.tumblr.com

Sobre o link...

estarei fora por um tempo.

tirei seis meses pra viajar por aí de carona. mochilão. é isso.

a única certeza é que em algum momento estarei em machu picchu. quando? bom...

não sei.

aí pensei em entrar na internet de vez em quando pra alimentar o blog... é que escrever é meio que uma compulsão minha. e sei que vou ter vontade de mandar notícias, mesmo que seja nesta minha linguagem hiper-figurada de sempre.

mas também tinha esse outro formato que eu estava com vontade de experimentar, o tumblr. o tumblr tem uma dinâmica própria, e me parece mais "arejado", por assim dizer (sim, sim, linguagem figurada). quero esse espaço pra eventuais imagens, músicas, citações, textos curtos e textos de expressão mais direta - enfim, menos figurada. sei lá. e já que estou nessa de ir ver coisas novas, achei que a hora era agora.

e o tumblr também tem a possibilidade de postar coisas retiradas de outros blogs, o que eu gosto. afinal, esse é o espírito, agora. intercâmbio.

claro, textos como os que publico por aqui também podem aparecer por lá uma hora ou outra.

mas estou completamente descompromissado.

* * *

5% das pessoas pra quem eu contei sobre a viagem disseram:
"é perigoso!"

15% disseram um simpático:
"é a tua cara"

30% disseram:
"tenho vontade de fazer uma coisa assim, mas não tenho coragem"

50% disseram alguma coisa parecida com:
"me leva junto!" (pô, vamo!)

minha mãe disse:
"você vai levar um celular!"

e o paraíba disse:
"tudo isso acontecendo no mundo... e o ró vai dar uma volta"

sexta-feira, 25 de março de 2011

Do not disturb

Já vivi meus dez anos a mil.
Já vivi meus mil anos a dez.
Agora eu quero andar só um pouco acima do limite
E aproveitar a paisagem.

segunda-feira, 21 de março de 2011

Um pouco mais de caos antes de ir

Foi-se o tempo em que eu acreditava que em alguma fonte humana eu beberia água limpa.

E repeti por muito tempo, antes de abrir a porta, aquele envergonhado "não repare a bagunça" - mas bem que eu tentei, Deus sabe que eu tentei lavar os azulejos; agora qualquer coisa serve, qualquer vento serve se você não sabe pra onde vai mas já não quer ficar parado; não repare a bagunça, estou fazendo de propósito: depois que começaram a implicar com minhas frases de efeito anunciei bem alto na saída da faculdade:

- Encontrei um fio solto em um cantinho do Universo e decidi puxar, só pra ver se desfia o resto.

Bom, fiz uma lista de coisas que me entristecem; me lembrei de sonhos em que eu mergulhava na mais absoluta solidão; joguei tudo pro alto e arrisquei ser mais sincero; agora estou bem, mas fiquei um pouco chateado. Abro o caderno em um antigo conto: um cara terminando com a namorada em pleno sábado de carnaval, sentados à portaria de um prédio a algumas quadras da Avenida do Samba; ela um pouco bêbada e com os olhos cheios de lágrimas não percebe de imediato que a risada ecoando pela rua não veio do namorado, mas de um grupo de rapazes que está passando por ali; "o que é isto agora?", ela pergunta irritada; "é um exército romano", explica o namorado; a menina enxuga os olhos, avista os rapazes e percebe o resto de sua lucidez se esvaindo enquanto só lhe resta murmurar espantada: "não é que é mesmo?!"...

- Inteligência é transformar informação em conhecimento - disse o meu pai um dia desses.

- E sabedoria, pai, o que é?

Meu pai baixou os olhos, refletiu por um instante e concluiu:

- Sabedoria é quando, depois de transformar informação em conhecimento, a gente atravessa o rio.

Ah, Deus, não é que é mesmo?!... Não cabe toda a minha roupa na mochila, nem me agrada muito a perspectiva de encontrar um paraíso abarrotado de turistas, máquinas fotográficas e informações enciclopédicas, mas lá vou eu com o começo do outono, porque me assustei quando acordei e vi que estava ficando tarde. Contei meus planos pra um aluno amigo e no dia seguinte ele me disse: "fiquei triste, não consegui dormir direito; por que você vai embora?" - mas o meu coração guardava o mais devastador e delicado silêncio.

"Não era a ponta solta do Universo", eu deveria ter dito. "Era uma tapeçaria perfeita falsificando um limite".

Desculpem, amigos. Mas eu já estava do outro lado.

quinta-feira, 17 de março de 2011

Um pouco mais que só palavras

O homem que te escreve agora, garota, não procura abrigo nem reclama mais da sede ou do cansaço de uma longa caminhada pelo inferno; as cicatrizes invisíveis, aquelas que eu cantava com revolta ou desespero, já não guardam a dor do instante em que surgiram mais do que alimentam meu orgulho por haver sobrevivido a elas; o homem que te escreve agora, garota, é um voluntário para a prisão do teu amor porque dispõe livremente do próprio caminho, e está aqui fora com a mesma paixão pelas coisas com que estaria em teus braços - não te peço um rumo, o esquecimento ou uma razão para a jornada que afinal já sei obedecer e desejar: estou aqui, garota, porque de todas as coisas que já vi e provei no mundo nada me pareceu mais belo que esse teu olhar, que é como uma lembrança de Deus; estou aqui porque encontrei o que eu estive procurando desde o início, e porque reconheço enfim que valeu a pena cada eternidade de angústia e de desesperança - porque eu não estava errado, porque você existe, e saber disso basta. Não me entenda mal: você não é menos livre do que eu para fechar a porta ou dizer que nada disso te interessa agora, que eu volte mais tarde ou nunca mais diga o teu nome em voz alta - eu não espero que você abra mão da própria liberdade; já é parte do que eu sou cada momento que passamos juntos, a memória ainda quente das tardes de sol em que nos pertencemos quase sem notar, os gestos e palavras de afeto que reacenderam no meu coração envelhecido a luz incontrolável daqueles que acabaram de nascer. Eu te amo, e nada disso faz pedidos: é só a verdade que eu te entrego agora; mas mesmo entregue ela continua sendo minha, e permanece a mesma. O homem que te escreve agora, garota, te escreve porque viu se renovarem suas asas e percebe que é o momento da pergunta: vem comigo? Eu quero. Ou eu te levo na alma.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Represa

Num universo paralelo, mas aqui, às margens do nosso, ficaram palavras não ditas e o brilho dos olhos, ficou um sorriso sincero, ficou a ternura que se gastou na luta. Num universo paralelo, aqui dentro, há todo esse mar contido pela solidez das horas, por um salário mais alto, por uma ideia oca de maturidade. Em outra dimensão, sem conseguir atravessar a fortaleza fria da realidade, arde um desejo caloroso e limpo de criar, de ver crescer e de crescer em segurança, iluminado, vivo; e soterrado, assim, pelos entulhos de uma sobriedade estéril, adormeceu o sonho de permanecer sonhando - mas no vazio dos cofres, nas fendas do asfalto, nos intervalos entre as senhas dos balcões de atendimento escapa às vezes o seu hálito de sonho, o líquido invisível que enverniza a matéria; e sem que o saibamos, e sem que a matemática permita, é esse universo oculto de esperanças ingênuas que nos move, que nos alimenta, e que nos lança cada vez mais perto de uma coisa que buscamos sem sequer nos recordar: alguma coisa como um lar perdido, como uma paz impossível, como o alívio quase imerecido de ser afinal perdoado.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Jornada

1. A cabeça encostada na janela do ônibus, chove lá fora e não sei se estou triste por estar longe de casa ou por achar que nunca a tive. O mundo dá voltas, corre o asfalto sob o meu corpo imóvel e faz um frio insuportável em todos os lugares. Parado diante de um guichê na próxima rodoviária, eu ficaria eternamente sem sequer me perguntar "pra onde, agora?", porque a vida é muito assustadora na modalidade de poder ser tudo. Ser livre é desgastante; mas não adianta, não consigo dormir em viagens.

2. Leio uma história didática chamada Educação ou Culpa, meio boba até, mas com uma capa bonita de couro verde e detalhes em dourado. Um menino vai passar as férias de verão com a família de um padrinho, e logo nos primeiros dias quebra um vaso da sala em uma brincadeira. O padrinho proíbe todo mundo de se aproximar dos cacos; o menino entende que é pra que ele não se esqueça de ter sido irresponsável e saiba se comportar melhor dali pra frente. Os dias seguintes vêm em clima de tortura psicológica: ninguém mais fala sobre o assunto, mas o menino percebe que todos o observam de canto e acha que sua presença ali já não é muito bem vinda. A culpa pelo acidente com o vaso atinge um grau de delírio na noite em que a filha do padrinho cai sobre os cacos e se machuca seriamente. Naquela noite, quando todos dormem, o menino vai em transe até a sala e começa a retalhar o próprio corpo. Sangra até perder os sentidos; acorda na manhã seguinte com o padrinho ao seu lado em um quarto de hospital. E finalmente pede desculpas, chora, explica-se, faz sua catarse. O homem não responde, meio constrangido e fragilizado, o que desperta uma raiva inesperada no menino: "Por quê", ele explode então, "por que você fez questão de deixar os cacos na sala?". O homem passa a mão pela testa, hesita, depois responde como se pedisse desculpas por ter tido uma ideia idiota: "Eu deixei lá pra que você varresse".

3. No quarto de um hotel barato na beira da estrada, tentando colocar ordem no caos. A luz é tão fraca que mal consigo enxergar o meu rosto do outro lado do espelho. E tenho ainda uma longa caminhada. Desenho uma runa com o canivete no tampo da escrivaninha: Nauthiz, situações perigosas.

4. Pensar que um dia estivemos completos, na infância talvez, seria o mesmo que dizer que ao longo da vida só o que fazemos é perder pedaços, ir apagando aos poucos. Não quero, não posso pensar assim; preciso seguir adiante, agora, sem nem perguntar o nome daquilo que se perde. Alguma coisa terá que morrer, eu sei. Mas outra coisa espera pra ser conquistada.

5. Pela janela do quarto, ouço a voz da Alice de Lewis Carroll num terreno baldio: "Não, já decidi: se sou Mabel, vou ficar aqui embaixo! Não vai adiantar nada eles enfiarem as cabeças para baixo e dizerem: 'Venha para cima querida!'. Vou olhar para cima e dizer: 'Quem eu sou então? Primeiro me digam isso, e depois, se eu não gostar, vou ficar aqui embaixo até ser outra pessoa'..."

6. Muito antes de eu ter me tornado um Mago, já tinha ouvido algumas lendas sobre a Flor de Vidro: uma peça mágica tão poderosa que daria àquele que a possuísse tudo de que ele sente falta. Dediquei muitos anos à sua procura, ridicularizado pelos meus irmãos, eu mesmo muitas vezes duvidando seriamente de sua existência; até que a encontrei, nem tão escondida assim, no porão de uma casinha próxima ao farol de Blavand, na Dinamarca. Por sorte, antes que eu a tomasse com um gesto de triunfo, reparei em um bilhete envelhecido do seu lado: a Flor de Vidro é extremamente frágil, e ainda não está pronta. Ela precisa ser banhada em um lago branco que não sei onde fica, e só depois disso é que estará de posse dos seus plenos poderes. E foi assim que a minha bênção se tornou maldição: agora mal consigo dar um passo sem temer que ela se quebre, e que esteja perdida assim a minha única chance de ter tudo o que me falta. Uma ansiedade louca, um pavor quase incontrolável vigia os meus gestos. Antes de me dar os paraísos que eu quero, a Flor de Vidro me oferece o inferno do mais absoluto medo.

7. "Mas se eu vencer esse medo", eu me pergunto, "não estarei conquistando em mim mesmo tudo o que me falta?"

sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

Para as horas mais tristes

Solte o tempo e mergulhe.
Cada imagem é um universo completo.
Eis aqui os meus: rosa branca,
araçá,
uma tarde na cascata
e o nome de um poema antigo:

Acorda, Estrela.

Solte o tempo e me abrace.

segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

Blivet

Decidi que estava na hora de encarar o problema de frente.

Passei um tempo só olhando, desconfiado. Então o revirei, analisei cada parte, identifiquei seu mecanismo. Insatisfeito, estudei teorias, formulei outras, testei diversas metodologias e técnicas de abordagem. Desvendei segredos que sequer se imaginava que existiam. Atingi profundidades nunca antes visitadas. Dominei a coisa toda. Apossei-me dela. Hoje conheço o meu problema melhor do que qualquer ciência. E finalmente concluí, sem a menor sombra de dúvida:

Não sei onde fica a frente.

sexta-feira, 28 de janeiro de 2011

Soundtrack

Um vento, um fim de tarde, a chuva que se armava sobre os plátanos, mais nada.

Mais tarde navegando em blogs de desconhecidos, expressões desperdiçadas, um tempo diante de um desenho postado por Diana às 15:38 no dia 17 de novembro de 2009 com o texto: "Desde lá, quando comecei a dar face ao sonho, desde lá, quando comecei a dar ouvido às expectativas!"

Ouvindo:
- The Outfield, I don't wanna lose your love tonight
- The Pretenders, I'll stand by you
- Semisonic, Secret smile
- Foreigner, Waiting for a girl like you
- Peter Frampton, Baby, I love your way

Sentado em um banco sob os plátanos, esperando pela chuva, até que uma menina resolveu parar a uns poucos metros de mim pra terminar um namoro pelo celular - você não acredita, mas eu juro que conheço o cara com quem ela falava - ei, dá pra ir odiar alguém lá do outro lado? Eu ia bem sem os seus dramas.

Ontem dei um beijo sob a chuva... Não, não quero falar sobre isso (por que é que chove tanto no verão, por que é que de repente fez tanto calor dentro do carro?!) Hoje eu quis baixar A Dama e o Vagabundo, hoje eu não tive aula, hoje eu me castiguei sob um sol de quarenta graus espalhando terra nova no jardim dos outros mas não me importava, só queria muito uma coca-cola. Estou um pouco entediado. Mas um letreiro imenso de neon na pedra negra do meu peito: Não se pode telefonar para a Penélope a uma hora dessas.

E eu me pergunto: qual é o verdadeiro jazz? Pra que serve o blues, quem afinal ainda se importa com a bossa-nova?

Do blog Uma música por dia: "Fiquei sem entender o fato até este final de semana, quando assisti ao documentário Só dez por cento é mentira e Manoel de Barros explicou-me o acontecido: 'ontem choveu no futuro'".

De repente, todas as canetas bic do mundo pararam de funcionar.

Eu vou embora, eu não amo ninguém, me deixe ir, eu amo muita gente (eu sou um marciano do Bradbury, enlouquecendo em um cais porque é da sua natureza se transformar naquilo que a outra pessoa quer ver mas de repente é muita gente querendo muita coisa, muito Marte, muito mar) me deixe ir, não posso mais, nunca gostei de The Pretenders e você sabe disso, não, garota?!

"Se você não entrar naquele avião, você vai se arrepender", bla bla bla bla, reveja Casablanca.

Eu sou um cínico.

E eu estava em paz, eu estava tão longe...

Tudo tão quieto.

Enquanto a noite e a chuva desabavam sobre os plátanos.

sábado, 22 de janeiro de 2011

O espelho negro

Porque vocês também esperam que nós, filhos da noite, estejamos velando o seu sono. E quando todos os castelos ruírem, e quando todos os caminhos despencarem num abismo vocês pensarão em nós com a cabeça erguida e poderão gritar: "Não sou assim; não sei sofrer, sou forte". E deixarâo à nossa voz o grito de socorro, e escutarão as nossas músicas dissolvendo a sua tristeza em algum andar subterrâneo de suas almas enquanto vocês vestem suas melhores roupas para festas e repetem a si mesmos que a vida já é difícil demais para se desperdiçar qualquer tipo de arte com um sofrimento adolescente; e vocês nunca dirão "obrigado", e nós seguiremos cantando. Porque vocês precisam de fantasmas como nós vasculhando as ruas pela madrugada para que esse medo que vocês têm deles fortaleça o  paraíso caro de suas convenções irrefletidas; porque sem a nossa fúria o seu amor que sempre vence orgulhoso no final jamais teria inimigos, e soaria tão bobo e desinteressante quanto um cupido que atirasse papeizinhos coloridos no lugar de flechas; porque vocês nos pedem sem querer, quando tentam evitar a horrível impressão de estarem andando em círculos há séculos, desesperadamente vocês pedem que poetas, bêbados, loucos e crianças cheguem com notícias lá de fora - mas vocês precisam nos odiar para que nenhum de nós queira ficar em casa muito tempo; e é só assim que o mundo segue adiante, meio às tontas, ao mesmo tempo em que vocês conseguem preservar a memória idólatra dos seus vencedores a uma distância segura, lavando as mãos para o agora, protegidos de todos os riscos em trabalhos infrutíferos cada vez mais burocráticos, acenando à distância para nós, nós: os vagabundos marginais, nós que talvez tenhamos sido os seus mais queridos amigos de infância, mas que não demos certo; nós que nos perdemos, nós que fracassamos, nós que ficamos para trás apenas para lhes dar esta medida exata do alcance das vaidades que vocês "não têm".

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Chegada

Parece que faz tanto tempo;
nada mudou no trajeto:
anseios
de quando éramos livres
retornam agora com as ondas.

Eu te quero
- e isso é bom que se diga -
muito mais do que o necessário.
E este excesso
fica emperrado nos vãos
do que me move.

Parece
que tudo o que era doce se fez sólido
e por isso improvável.
Parece.
Parece que nunca nos alcançaremos.

Mas hoje,
enquanto as ondas e a brisa dançarem
suaves,
meninas da noite, eu,
homem sóbrio
- hoje,
depois de tudo o que passei -
estarei dormindo, afinal,
ainda mais criança
do que no princípio.