segunda-feira, 20 de julho de 2009

Das pequenas mudanças

Não deixe que te enganem, meu bebê: aqui não somos livres para acreditar em qualquer coisa. Dizer o contrário é só um recurso básico da hipnose. Não vá espalhando por aí que nosso amor é eterno e puro, que vivemos de brisa e de bondade ou que estamos semeando um mundo para a oitava geração depois da nossa: não se deve perturbar assim o sono de tanta gente. Qualquer verdade, bebê, em tempos tão confusos como os nossos, só deve ser passada adiante no mercado negro, dentro dos queijos ou dos tubos de pasta de dente. Até que um dia, às sete da manhã, depois de ver a própria cara sem brilho e amassada no espelho, um joão-ninguém vai reparar no despertar dos filhos e exclamar: "Não é que é mesmo!?"... e nossa última revolução será feita de pequenas implosões, não do contrário. Porque o mundo, bebê, o mundo real e esquecido é feito desses joão-ninguéns – de sua ternura contida, da esperança guardada, do encantamento abafado diante da beleza que persiste. Mas também não tenha pressa, meu bebê: nenhum trabalho importante é para ontem. Temos ainda muito tempo. Descanse em minha casa por enquanto, beba um chá, aceite um pedacinho deste queijo. Mastigue devagar e com prazer. Antes, e acima de tudo, não deixe que te vendam o seu medo – crescer demora, meu bebê, e o mundo desabar seria só o começo.

Um comentário:

a disse...

Eu tô aqui há cerca de 20 minutos tentando colocar alguma palavra que expresse o quanto esse texto... esse texto... esse texto é... é sublime.

^^